Primeira Era Vargas

19-07-2011 01:41

Fragmentos retirados de Bresser Pereira (1987), Abreu (1990) e Corsi (1999)

 

Anos 30: Brasil e a sua revolução industrial.

Antecedentes

1) Desenvolvimento da cultura do café partir de meados do século XIX. O ciclo café tem características diferentes do ciclo do açúcar e do ouro.

Diferenças: a) ciclo do açúcar e do ouro ocorreram em plena época colonial.

                    b) com o café começa a ser usado em grande escala o trabalho assalariado, ao invés do trabalho escravo.

Conseqüência: a) Surge o trabalho assalariado no campo que permitirá a formação de um incipiente mercado interno.

                        b) Desenvolvimento do comércio interno

                        c) Surgimento das condições básicas para a instalação de um industria nacional orientada para o mercado interno.

 

2 Desenvolvimento da indústria têxtil – Meados do século XIX

 

3) No campo político e social – Surgimento de uma classe média mais atuante no final do século de XIX.

            a) Constituição do exército nacional (Guerra do Paraguai)

            b) Proclamação da república

 

O início da revolução industrial brasileira.

            Conjugação de dois fatores principais: A oportunidade econômico de investimentos industriais proporcionado pela depressão econômica e a revolução de 30.

 

1o fator) Revolução de 30: “Tirou” do poder a oligarquia agrário-comercial brasileira. Tal oligarquia esteve vinculada a interesses :

 

-   Coloniais portugueses

-   A partir da independência: interesses de países industrializados, em especial com a Inglaterra. 

            A chegada de Vargas ao poder marca uma nova era na história do Brasil, havendo estabelecido as condições políticas necessárias para revolução industrial brasileira.

 

1o fator) Surgimento de oportunidades de investimentos industriais devido a depressão mundial dos anos 30.

- A procura interna manteve-se relativamente constante.

- Os preços dos artigos manufaturados cresceram muito.

- Primeiras industrias: Bens de consumo que exigiam equipamentos simples que podiam ser fabricados no Brasil. (Ex.: Indústria alimentícia, artigos de higiene e limpeza, perfumaria, farmacêutica).

 

A crise de 29 e os impactos sobre a economia brasileira.

 

- Primeiro momento de crise desvalorização da taxa de câmbio.

 

- Além disso, a baixa dos preços do café permitiu um aumento de 25% em volume físico.

Porém este aumento não foi suficiente para absorver a produção de café.

 

- A solução para evitar que os estoques de café continuassem a pressionar cada vez mais para baixo seus preços foi sua compra pelo governo e destruição dos excedentes.

 

- Segundo Celso Furtado “ao garantir preços mínimos de compra, estava-se na realidade mantendo o nível de emprego da economia exportadora e nos setores produtores ligados ao mercado interno ... o que importa ter em conta é que o valor do produto que se destruía era muito inferior ao montante da renda criada”.

 

- O governo ao comprar os estoques de café não tinha a intenção de manter o nível da demanda agregada nacional, mas simplesmente a de tomar uma medida em defesa da cafeicultura. Apesar disso o governo brasileiro seguiu a política de Keynes (antes da publicação de “A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda” em 1936) permitindo que o nível de procura agregada fosse mantido durante a depressão econômica.

- A manutenção relativa da procura agregada teve grande importância no surgimento de oportunidades de investimentos industriais aliado a grande alta dos produtos manufaturados importados.

 

- Dada a conjuntura e a conseqüente dificuldade para importar artigos manufaturados de consumo, abriu-se grade oportunidade para que os empresários nacionais realizassem investimentos altamente lucrativos no setor industrial. A capacidade ociosa existente nas empresas nacionais foi rapidamente utilizada. Além do setor têxtil, já instalado no Brasil, novos investimentos, em novos setores foram instalados. Estava assim lançado o desenvolvimento industrial brasileiro.

 

O Boom Econômico 1934-37

            - Com a manutenção da política cafeeira teve-se como resultado uma expansão de 20% no valor das exportações entre 1935 e 1936, enquanto o nível de importações manteve-se praticamente constante, permitindo que o Banco do Brasil acumulasse reservas nesse período. A relativa folga cambial propiciou a adoção de uma política liberal no que se refere à remessa de lucros, bem como relaxamento do controle de importações, com intuito de atrair capitais estrangeiros. Entretanto, com a recessão norte-americana em 1937-38 tal política fracassa na medida em que o nível de reservas no final de 1937 já tinha se reduzido bastante.

            - Apesar das dificuldades em relação ao balanço de pagamentos, a economia continuou crescer 6,5% ao ano entre 1934 e 1937. O encarecimento das importações permitiu a utilização da capacidade ociosa na indústria enquanto a continuada adoção de políticas fiscal, cafeeira, monetária e creditícia expansionistas permitiu a sustentação da demanda. A política fiscal do governo gerou déficits na execução das contas públicas maiores do que os planejados nas propostas orçamentárias. A política de aquisição e destruição dos estoques de café permaneceu, nos seus aspectos fundamentais, inalterada em relação à adotada a partir de 1933. A política monetária foi moderadamente expansionista observando-se a aceleração da inflação no final do período. Com relação a agricultura observa-se que o setor registrou um pequeno crescimento (pouco mais de 2% ao em 1934-1937) contrastando com o desempenho do produto industrial onde foi observado um crescimento de mais de 11% ano.

            - A partir de 1934-35 os Estados Unidos enfrentaram importante ameaça no Brasil no que se refere ao crescimento do intercâmbio comercial entre Brasil e Alemanha sob a forma de acordos bilaterais de comércio. A tolerância norte-americana em relação ao comportamento brasileiro pode ser atribuída à prevalência dos objetivos estratégicos de longo prazo sobre os objetivos de curto prazo. Além disso, a aceitação tácita da posição ambígua do governo brasileiro no que se refere ao comércio internacional se dava em função da crença norte-americana de que a contenção do crescimento da influência alemã na América Latina passaria pelo fortalecimento da economia brasileira às expensas da Argentina (mostrava-se excessivamente rebelde em relação a submissão aos interesses americanos). Assim, segundo o governo norte-americano “a ditadura brasileira era mais aceitável que as outras”.

            - O acordo entre Brasil e Alemanha estabelecia o comércio de compensação como forma básica para o intercâmbio de mercadorias. Eventuais saldos comerciais bilaterais resultariam na acumulação de depósitos inconversíveis em mil réis ou marcos compensados caso Alemanha ou Brasil vendessem mais do que comprassem no outro mercado. Com isso observou-se um crescimento da participação alemã no mercado brasileiro ao longo da década (12% para 20% das importações brasileiras) enquanto que a participação norte-americana manteve-se praticamente inalterada. Observou-se ainda uma queda na participação do Reino Unido (19% para 11%). Na verdade o que houve foi uma drástica substituição de produtos britânico por produtos alemães.

 

O Estado Novo e Economia de Guerra (1937-1945)

 

            - Com a implantação do Estado novo em novembro de 1937 consolidou-se a reversão da descentralização republicana, fortalecendo-se o poder central. Até 1937, a garantia de um oferta “adequada” de divisas que possibilitasse a liquidação de compromissos financeiros era objetivo explícito da política econômica. Em 1937, entretanto, explicitou-se a contradição entre os programas de investimentos públicos e a manutenção dos pagamentos do serviço da dívida o que conduziu a uma reversão da política adotada desde 1930. Começava a tomar corpo a idéia de que seria imprescindível incrementar rapidamente o desenvolvimento nacional calcado na indústria.

- Vargas aprofundou as relações comerciais (acordos bilaterais de comércio) com a Alemanha ao assinar em 1938 um acordo com empresa alemã Krupp para fornecimento de peças de artilharia e outros armamentos. Outro ponto de inflexão da política econômica externa foi a decretação da moratória da dívida externa e a reintrodução do monopólio do câmbio. Com a moratória, o governo brasileiro procurou não comprometer as disponibilidades de divisas no pagamento da dívida externa. Essas medidas permitiram a manutenção de um nível relativamente elevado de importações em 1938 e 1939 o que dificilmente teria sido possível sem a interrupção dos pagamentos da dívida externa.

 

            - Com o advento do Estado Novo, a implantação de uma usina siderúrgica moderna e de grande porte passou a ser considerada a dificuldade mais séria para o desenvolvimento e a segurança nacional, tornando-se o centro das preocupações e da ação do governo Vargas que redobrou esforços para concretizar o projeto. A idéia central do governo consistia em promover a criação das indústrias de base (que se confundia com a implantação da grande siderúrgica), a execução de obras públicas produtivas e o aparelhamento da defesa nacional de maneira que não afetasse o equilíbrio orçamentário. Para o governo as metas de desenvolvimento com a manutenção do equilíbrio orçamentário, naquele momento, não pareciam incompatíveis.

 

            - Contudo, não existe um projeto acabado, mas sim uma estratégia voltada para o desenvolvimento calcado na indústria. Segundo Corsi (1999) o que se encontra é um conjunto de projetos, alguns de caráter amplo, outros específicos, formulados à medida que os problemas iam se colocando. Na opinião do autor o projeto de Vargas consistia em um processo redefinido constantemente pelas injunções de fatores políticos, sociais econômicos internos e externos.

            - Assim, o projeto do Estado Novo esbarrava na questão de como financiar o desenvolvimento mais autônomo e modernizar as forças armadas. O governo Vargas parecia crer que em princípio seria possível faze-lo com base no capital nacional, desde que para tanto houvesse mecanismos para mobiliza-lo e direciona-lo corretamente. Nesse período observa-se a tentativa de organizar um esquema de financiamento interno tanto para o capital privado quanto para gasto público, mas parecia faltar um plano consistente e capaz de superar as carências de crédito de longo prazo e ampliar os recursos de para financiamento do gasto público.

            - Até fins de 1939, existia, pelo menos de maneira aparente, uma margem de manobra para países como Brasil. O acordo com a Krupp para o fornecimento de armas e a ampliação do comércio compensado com o governo alemão, somados à manutenção da moratória da dívida externa, apesar da forte oposição dos credores e do governo norte-americano a essas medidas, acenavam com a possibilidade de o Brasil sair da esfera de influência norte-americana. No entanto, a situação internacional era bastante confusa e as incertezas sobre o futuro levaram o governo brasileiro a assumir um posição cautelosa, pois uma aproximação mais decidida junto à Alemanha poderia isolar o país e deixa-lo à mercê de represálias norte-americana caso estourasse uma guerra.

            - A situação interna também era bastante complexa. O Estado Novo, de um lado conseguiu formar uma sólida base de sustentação política, mas por outro as classes dominantes e as forças armadas estavam internamente rachadas no que se refere às alianças potenciais do Brasil. Essas divergências se faziam sentir dentro do próprio governo. Aranha defendia a aproximação com os Estados Unidos e um desenvolvimento mais integrado à economia desse país. Por outro lado, naquele momento era a Alemanha que acenava com o fornecimento de armas e de bens de capital em troca de matérias-primas.

            - O governo Vargas procurou manobrar entre a Alemanha e os Estados Unidos tirando proveito das oportunidades que se abriam com o acirramento dos conflitos internacionais, procurando articular, ao mesmo tempo, a participação do capital norte-americano e alemão no processo de desenvolvimento. Ao não se comprometer firmemente com nenhum deles, como conseqüência, não conseguiu o apoio efetivo de nenhuma das partes. Essa indefinição acerca dos rumos da política externa a serem adotadas só foram encaminhadas quando o conflito entre as potências evoluiu para um conflito aberto.

            - Em 1938 e 1939, a situação internacional agravou-se e o governo Roosevelt considerava que seria inevitável um novo conflito que extrapolaria a Europa. Nesse sentido o governo norte-americano considerava fundamental “estabelecer o pleno controle estratégico da América Latina e assegurar o apoio de seus governos”. Para isso, seria necessário eliminar a influência comercial, política, ideológica.

            - A missão Aranha aos Estados Unidos marca o início de longo período de relações “especiais” entre o Brasil e os Estados Unidos. Num contexto de crescentes dificuldades enfrentadas pelo Brasil em seu comércio de compensação com a Alemanha, da perda de importância das relações anglo-brasileiras e da crescente consciência em Washington de que as questões econômicas de interesse dos Estados Unidos no Brasil deveriam ser examinadas tendo em vista os objetos políticos norte-americano no Brasil.

           

- A agenda incluía questões relacionadas à defesa nacional, às relações comerciais, à dívida pública externa e ao tratamento recebido pelos investimentos diretos norte-americanos no Brasil e assuntos ligados à política cambial, criação de banco central e planos de desenvolvimento  de longo prazo.  Os resultados concretos da missão foram reduzidos ante a pauta proposta e a expectativa de Aranha. Com relação ao crédito para saldar os atrasados comerciais ficou acordado um empréstimo de 19,2 milhões de dólares com prazo de pagamento de 24 meses. Em contra-partida o Brasil se comprometia a modificar o regime cambial. Entretanto, os compromissos firmados por Aranha sinalizavam para uma mudança de rumo da política econômica, no sentido de maior abertura da economia brasileira e de aproximação aos EUA, rompendo com projeto de desenvolvimento autônomo que acabara de ser esboçado. A Missão Aranha parece ter sido o primeiro ato em que ganhou contornos mais nítidos a idéia de um projeto nacional de desenvolvimento associado ao capital estrangeiro, indicando os obstáculos ao desenvolvimento  mais autônomo.

            Além disso, o início do intercâmbio de missões militares entre Brasil e os EUA interromperam a aproximação alemã de Vargas. A partir dessas decisões e dada a escassez de recursos fiscais, o governo opta pelo financiamento internacional da siderúrgica de Volta Redonda, marco inicial da nossa industrialização.

            - Com a aproximação do final da guerra verificou-se uma reorientação da política norte-americana relativa aos governos latino-americanos que não tinham sido eleitos pelo voto popular. Nos anos iniciais da guerra a ditadura brasileira era considerada como “mais aceitável que as outras”. Porém, depois de 1943 as preocupações quanto à falta de democracia interna tornaram-se evidentes.  O governo norte-americano começava a buscar uma solução “liberal” no Brasil que removesse as contradições entre o regime político autoritário e a política externa pró-aliada, evolvendo a adoção de políticas econômicas mais alinhadas com seus interesses.

 

Referências Bibliográficas;

 

ABREU, Marcelo de P. Crise, crescimento e modernização autoritária: 1930-1945. In: ______. (org), A Ordem do Progresso - Cem Anos de Política Econômica Republicana 1889-1989. Rio de Janeiro: Campus, , 1990.

 

BRESSER PERREIRA, L. C. Desenvolvimento e crise no Brasil: 1930-1988. 5. ed. São Paulo: Brasiliense, 1987.

 

CORSI, Francisco L. O projeto de desenvolvimento de Vargas, a missão Osvaldo Aranha e os rumos da economia brasileira. In: História Econômica & História de Empresas. Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica (ABPHE), vol. II, I, 1999.