Os Planos de Estabilização Bresser, Verão e Collor I e II

19-07-2011 01:52

Os Planos de Estabilização Bresser, Verão e Collor I e II.

 

Esta seção se baseia em Baer (1996)

 

 

 

Sarney depois do colapso do Cruzado

 

            Ao contrário de suas posições durante o Plano Cruzado, os formuladores da política econômica no período de 1987-1989 parecem ter reconhecido a importância de se controlar o déficit público a fim de atingir uma estabilização duradoura, embora isso não tenha representado a implementação de medidas drásticas de austeridade.

 

            Por razões políticas um verdadeiro ajuste fiscal não foi colocado em prática: faltou determinação ao Executivo devido a ansiedade em ver o Congresso votar a favor do mandato de cinco anos, uma vez que a maioria dos parlamentares nunca simpatizou com restrições fiscais.

 

            No orçamento do governo, os contínuos déficits conduziram a um rápido crescimento da dívida interna, e a uma aceleração da inflação. O aumento da dívida por sua vez, abalou a credibilidade dos títulos públicos, o que tornou indispensável o rápido aumento das taxas de juros. O crescimento da inflação também provocou uma redução dos prazos dos títulos do governo.

 

O Plano Bresser

 

            Depois do fracasso do Plano Cruzado, a taxa mensal de inflação disparou de 1,4% em outubro de 1986 para 27,7% em maio de 1987. Com esse aumento foi reintroduzida  a indexação oficial de contratos financeiros, representando o reconhecimento por parte do governo de fracasso de sua política. O ressurgimento da inflação estava relacionado ao realinhamento dos preços que haviam ficado defasados durante o congelamento do Plano Cruzado, aos aumento especulativos de preços na expectativa de outro congelamento de preços e a outras pressões de custos provocadas pelos aumentos salariais automáticos resultantes do mecanismo do gatilho incluído durante o Plano Cruzado.

 

            Contribuindo para as incertezas e instabilidades adicionais estava o déficit do setor público, que aumentou de 3,7% do PIB em 1986 para 5,4% em 1987, e a declaração da moratória da dívida externa em fevereiro de 1987 que causou declínio dos investimentos.

 

            O novo Ministro (Bresser-Pereira) assumiu o cargo em maio de 1987 e já no mês de junho introduziu um plano de estabilização econômica conhecido como Plano Bresser. Embora incluísse congelamento de preços e salários, ele diferia do plano anterior pela flexibilidade com que essas medidas deveriam ser aplicadas, com duração de noventa dias, permitindo ajustes periódicos.

 

            Essa maleabilidade também foi aplicada aos preços do setor público e ao câmbio, a fim de evitar dois dos maiores problemas do Plano Cruzado: os déficits das empresas estatais e supervalorização da moeda que prejudicou a competitividade das exportações do país.

 

            A ênfase dada pelo ministro ao controle do déficit público como um dos principais instrumentos de combate à inflação foi de grande importância. Sua meta era reduzir esse déficit para 2% do PIB até o final do ano.

 

            O Plano visava manter as taxas de juros acima as taxa de inflação a fim de evitar o excesso de consumo que havia contribuído para a queda do Plano Cruzado.

 

            O Plano Bresser acenou com a possibilidade de controle da inflação quando a taxa mensal caiu de 27,7% em maio, para 4,5% em agosto. Depois disso, a taxa de inflação voltou aumentar atingindo dois dígitos em outubro.

            O problema básico foi a falha em controlar o déficit orçamentário. Os gastos do  governo aumentaram devido aos aumentos salariais de seus funcionários que chegaram a 26% em termos reais e a necessidade de transferir recursos aos governos estaduais e municipais.

 

             Essa falta de controle fiscal refletia as prioridades políticas de Sarney de conquistar apoio no Congresso para incluir um quinto ano de mandato na nova Constituição. Com resultado o Plano Bresser fracassou e seu autor se demitiu em dezembro.

 

Maílson da Nóbrega, novo Ministro da Fazenda

 

            Maílson da Nóbrega foi o ministro da Fazenda e principal planejador durante o resto da administração Sarney. No início, se recusou a usar qualquer tratamento de choque, enfatizando somente a necessidade de se empregar medidas de austeridade para combater a inflação. Assim, não lançou nenhum programa de ajuste estrutural, mas limitou-se apenas a administrar o fluxo de caixa do tesouro de modo mais rígido.

Principais medidas:

-        proibição de contratação de novos servidores

-        suspensão temporária do mecanismo de indexação para reajustar os salários dos servidores públicos.

 

Essas políticas antiinflacionárias gradualistas passaram a ser chamadas de a estratégia do “arroz com feijão”, devido à falta de qualquer conteúdo estrutural significativo.

 

            Tal estratégia foi incapaz de controlar a inflação, cuja taxa média mensal aumentou de cerca de 18% no primeiro trimestre para aproximadamente 28% no último trimestre de 1988.

 

            À medida que reajustes preventivos de preços devido às expectativas de um novo programa de choques agravavam a situação, os formuladores de política econômica acharam necessário recorrer mais uma vez ao controle de preços. (Plano Verão- início de 1989)

Principais medidas:

a) um novo congelamento de preços e salários

b) eliminação da indexação, exceto para a poupança

c) introdução de uma nova moeda, o “Cruzado Novo”, equivalente a 1.000 Cruzados

d) tentativa de restringir a expansão monetária e de crédito (aumentando as exigências de reservas a 80%, e redução do prazo de empréstimos ao consumidor de 36 para 12 meses

e) uma desvalorização cambial de 17,73%

 

            O impacto do Plano Verão foi ainda mais breve do que os planos heterodoxos anteriores. De uma taxa mensal de 36,6% em janeiro de 1989, o IGP caiu para  4,2% em março, depois do que aumentou acentuadamente, atingindo 37,9% em julho, 49,4% em dezembro e  81% em março de 1990. Fica evidente a dificuldade de se manter um congelamento de preços.

 

            A crise econômica agravou-se nos últimos quatro meses do governo Sarney em que devido à ausência de um ajuste fiscal eficiente e tendo de enfrentar persistentes déficits orçamentários elevados, viu-se obrigado a manter uma alta taxa de juros, que elevou significativamente o custo da dívida pública.

 

 

Plano Collor I

 

            Quando Fernando Collor assumiu a presidência em março de 1990, a inflação havia atingido uma taxa mensal de 81%. Enfrentando uma hiperinflação em ritmo ascendente, Collor introduziu um surpreendente e novo programa antiinflacionário que consistia das seguintes medidas:

1- 80% de todos os depósitos do overnight, contas correntes ou de poupança que excedessem a NCz$ 50 mil (equivalentes a US$ 1,300 pelo câmbio da época); foram congelados por dezoito meses, recebendo durante esses período um retorno equivalente à taxa corrente de inflação mais 6% ao ano.

2- Foi introduzida uma nova moeda. O Cruzeiro substituiu o Cruzado Novo (Cr $ 1,00 = NCz$ 1,00)

3- Foi cobrado um imposto extraordinário e único sobre operações financeiras (IOF), sobre o estoque de ativos financeiros, transações com ouro e ações, e sobre as retiradas das contas de poupança.

4- Congelamento de preços e salários, com ajustes posteriores seguindo determinação governamental baseada na inflação esperada;.

5- Eliminação de vários incentivos fiscais

6- Indexação imediata dos impostos (sobre renda e produtos manufaturados)

7- Implementação de medidas disciplinares e novas leis reguladoras sobre operações financeiras, buscando reduzir a sonegação fiscal.

8- Aumento do preços dos serviços públicos.

9- Liberação do câmbio e adoção de várias medidas para promover uma gradual abertura da economia brasileira em relação à concorrência externa.

10- A extinção de vários institutos governamentais e o anúncio da intenção do governo de demitir cerca de 360 mil funcionários públicos.

 

O impacto do Plano I

            O impacto imediato causado pelo plano foi uma extraordinária redução da liquidez do país, visto que os meios de pagamentos (M4) como porcentagem do PIB caíram cerca de 30% para 9%. Dentro de um mês, a inflação baixou para uma taxa mensal de um dígito (5% ou 9%, dependendo do índice utilizado)

 

            A brusca diminuição da liquidez levou a uma queda nas atividades econômicas – crescimento negativo de 7,8% do PIB no segundo trimestre de 1990.

 

            A pressão exercida por muitos grupos socioeconômicos levou o governo a liberar muitos ativos financeiros bloqueados antes do programado. Tal liberação foi feira aleatoriamente, sem normas bem-estabelecidas.

As muitas concessões feitas em relação aos ativos bloqueados e o processo orçamentário do governo (cujos impostos podiam ser pagos na antiga moeda bloqueada, mas cujos gastos eram realizados na nova moeda) levaram a um rápido processo de remonetização. Depois de 45 dias houve uma expansão de 62,5% dos meios de pagamento, elevando-os a 14% do PIB.

 

Uma das principais metas do Plano Collor era reduzir o déficit primário de 8% do PIB para um superávit de 2%, tendo alcançado em 1990 um superávit de 1,2%. Entretanto, este resultado se deveu em sua maioria a medidas artificiais ou temporárias, como a cobrança de um imposto extraordinário sobre ativos e o atraso dos pagamentos do governo aos fornecedores.

 

No que se refere a tentativa de demissão dos servidores públicos, esta foi reprimida pela Constituição de 1988 que declarava que todos os funcionários do governo empregados por mais de cinco anos não poderiam ser demitidos. Para tanto seriam necessárias reformas no texto constitucional, fato que dependeria de apoio político no Congresso, apoio este que o Presidente Collor não podia contar.

 

O plano exerceu forte impacto recessivo sobre a economia devido ao extraordinário declínio no estoque de ativos líquidos. O PIB real caiu 7,8% no segundo trimestre de 1990.

 

Com o desbloqueio de vários ativos congelados nos meses seguintes, atividade econômica reagiu produzindo um crescimento de 7,3% no PIB no terceiro trimestre, enquanto que no último trimestre houve declínio de 3,4%. No ano observou-se uma queda de 4,4% no PIB. A queda no PIB no ano não pode ser atribuída apenas a implantação do Plano Collor uma vez que no primeiro trimestre do não já havia se observado uma decréscimo do PIB de 2,4%.

 

Quanto ao aspecto externo, deu-se início a um processo de liberalização que continuou com começo dos anos 90. Introduziu-se uma redução gradual de tarifas e permitiu-se a flutuação do câmbio.

O Plano Collor II

 

            Depois de uma queda inicial subseqüente ao anuncio do Plano Collor I, a inflação começou a subir em julho, como resultado do relaxamento do controle dos preços e salários e do processo irregular de remonetização.

 

            Em 1O de fevereiro de 1991 o governo implementou um novo pacote econômico que concentrava sua estratégia numa reforma financeira limitada que consistia na eliminação do overnight e num ataque a inflação inercial, por meio de um novo congelamento de preços e salários.

 

            O overnight foi substituído pelo Fundo de Aplicações Financeiras, cuja composição era regulada pelo governo: um mínimo de 43% de papéis do Governo Federal e Estadual garantido pelo Banco Central (assegurar demanda mínima por eles), 13% de obrigações de Títulos de Desenvolvimento (criados para financiar novos programas de investimento), 42% dos recursos deveriam ser investidos a critério das instituições financeiras, em papéis privados ou estaduais, sem a garantia do Banco Central e os restantes 2% deveriam ser mantidos com reservas sob a forma de depósitos à vista.

 

            Os rendimentos desse fundo deveriam ser baseados numa “Taxa Referencial” que era calculada a partir das futuras taxas de papéis privados e federais. O objetivo do governo em criar esse sistema em lugar dos antigos esquemas de indexação foi “eliminar a memória inflacionária”, possibilitando que as expectativas de inflação fossem incorporadas aos preços.

 

            Embora as medidas do Plano Collor II tenham causado um impacto de curto prazo sobre os preços (21% em fevereiro para 6% em maio) a equipe responsável por ele foi substituída em maio de 1991.

 

            O novo Ministro Marcílio Marques Moreira assumiu declarando-se contra qualquer tipo de tratamento de choque. As preocupações de curto prazo da nova equipe econômica concentravam-se no controle do fluxo de caixa e nos meios de pagamento, no descongelamento de preços e na liberação dos ativos ainda bloqueados, além de garantia de continuidade do processo de privatização.

           

            O governo conseguiu um superávit primário de 1% do Pib. Porém, os esforços fiscais foram mais do equilibrados pela expansão monetária (excesso de liquidez provocada pela liberação dos ativos). Com isso observou-se taxas de juros reais negativas.

 

            Embora as taxas de inflação tenham declinado em janeiro de 1992, tornaram a subir atingindo uma média de 25% ao mês na segunda metade do ano. O retorno a essas taxas foi atribuído à fraca política fiscal e as expectativas adversas associadas à crise políticas que levou ao impeachment do presidente.

 

            O PIB real declinou cerca de 1% em 1992, principalmente devido a retração industrial. Itamar Franco assumiu como presidente interino em outubro de 1992.

           

 

Baer, W. A economia brasileira. 1996. Ed. Nobel. p. 163-197.1