A Segunda Era Vargas 1951-1954

19-07-2011 01:44

Duas tentativas de estabilização :1951-1954

 

Esta seção se baseia em Vianna (1990), Melo (1994) e D’Araújo (1992).

 

 

Introdução

 

            O projeto do segundo Vargas consistia, em linhas gerais, em dividir o governo em duas fases: na primeira haveria a estabilização econômica e consistia fundamentalmente em equilibrar as finanças públicas de modo a permitir a adoção de uma política monetária restritiva e acabar com a inflação. A segunda fase seria a dos empreendimentos e realizações. O projeto se sustentava sobre dois pilares: o saneamento econômico financeiro (sucesso da primeira fase) e o afluxo de capital estrangeiro para financiamento de projetos industriais de infra-estrutura.

 

            Um outro pilar importante do projeto traçado foi a formação da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos (CMBEU). No discurso de posse de Truman, em janeiro de 1949, em seu ponto IV, foram dadas as primeiras indicações de mudança na posição norte-americana em relação ao financiamento de programas de desenvolvimento para o terceiro mundo. A CMBEU era fundamental para o sucesso da segunda fase do projeto do governo por duas razões: primeiro porque o financiamento dos projetos por ela elaborados pelo Banco Mundial e pelo Eximbank (banco de exportações e importações) asseguraria a superação de gargalos na infra-estrutura econômica do país (setores de energia, portos e transportes) fornecendo as divisas necessárias para essa finalidade. Por outro lado a superação dos gargalos na infra-estrutura poderia propiciar uma ampliação do fluxo de capital estrangeiro por meio de investimentos diretos ou novos empréstimos.

 

            Destaca-se também o papel da Assessoria Econômica. Esse órgão foi criado com o objetivo de atender as solicitações da Presidência da República para efeito de assessoramento e planejamento nas questões econômicas. Agindo fora das vistas publicitárias e com independência em relação aos interesses políticos-partidários, a Assessoria Econômica conseguiu levar a cabo um trabalho permanente que acaba por conferir ao Governo uma orientação administrativa que não poderia ser obtida por meio das composições partidárias. Entre as tarefas que couberam à Assessoria, destaca-se a elaboração de projetos tais como Petrobrás, Fundo Nacional de Eletrificação, Eletrobrás, Plano Nacional do Carvão, Capes, Reforma Administrativa, Carteira de colonização do Banco do Brasil, entre outros.

 

 

2 – Rumo ao colapso cambial, 1951-1952

 

Política Econômica externa

 

            Com relação as transações com o exterior, as perspectivas da economia eram  animadoras. A melhoria das relações com Estados Unidos (CMBEU) e a situação das transações comerciais externas era também bastante favorável graças à elevação do preço internacional do café iniciada em agosto de 1949. A política de comércio exterior dos dois primeiros anos do Governo Vargas manteve a taxa de câmbio fixa e sobrevalorizada e o regime de licenças para importar. Entretanto, houve um relaxamento na política de concessão nos primeiros meses do governo. Essa orientação foi sendo modificada na medida em que ficam evidentes do graves desequilíbrios acarretados na balança comercial.

 

            A extensa liberalização na política de licenças para importar deve ser explicada com base nos seguintes fatores conjunturais:

a) persistência da pressão inflacionária.

b) abastecimento precário do mercado interno no que se refere a produtos importados.

c) perspectivas favoráveis da evolução das exportações dos principais produtos.

            Por outro lado, a receita das exportações caiu 20% em comparação com 1951. As causas foram:

a) Os efeitos da sobrevalorização do Cruzeiro

b) Crise da indústria têxtil mundial (diminuição das exportações de algodão)

c) A expectativa generalizada de uma desvalorização cambial induziu os exportadores a reterem estoques.

 

            Assim, a crise cambial de 1952 tem origem na perda temporária do controle do comércio exterior e de uma série de fatores não previstos (tais como a crise da indústria têxtil) somado ao fato de que o aporte de capitais internacionais sob diversas formas foi bastante baixo no período.

 

A política econômica doméstica e a o desempenho da economia.

 

            A política econômica no período objetivou controlar a inflação. Para tanto buscou comprimir as despesas governamentais, aumentar a arrecadação, adotar políticas monetária e creditícia contracionista. Nesse sentido eram três os obstáculos a serem superados:

1) a presença de Ricardo Jafet (indicado por Ademar de Barros) na presidência do Banco do Brasil – deixava a política de crédito fora do controle do Ministério da Fazenda

2) dificuldade de alterar o sistema tributário para o exercício de 1951

3) conter as despesas do governo (orçamento aprovado pelo Governo Dutra)

 

            As despesas do governo foram de fato reduzidas (corte de investimentos). Por outro lado houve um aumento da arrecadação em função do crescimento da economia, melhoria do sistema arrecadador e o aumento das importações. Assim, a política monetária, acompanhando a fiscal, foi conduzida de maneira ortodoxa.

            Entretanto a política creditícia do governo moveu-se na direção contrária. Apesar da redução dos empréstimos do Bando do Brasil ao Tesouro Nacional (em função do superávit comercial) houve grande expansão do crédito às atividades econômicas. Com isso não houve a reversão da tendência da inflação iniciada no governo Dutra.

 

 

 

3 – A transição para o novo ministério

            No início de 1953, a conjuntura econômica estava dominada pelo colapso cambial. Com atrasados comerciais acumulados em mais de US$ 600 milhões e sem ter obtido êxito na redução da inflação o projeto de saneamento das finanças dos Estado parecia sofrer sérios abalos.

            A idéia de uma segunda fase do governo apoiava-se na estabilização da economia e na ajuda financeira internacional (fundamentada na CMBEU). Ao longo do primeiro semestre de 1953 esses dois pilares ruíram. Por outro lado, o crescimento dos movimentos sociais (crescentemente mobilizadores e reinvidicadores) e com a reacomodação política derivada das eleições municipais de maio de 1953, levou o governo ao abandono do projeto inicial, à decisão de sustentar o propósito de estabilização da economia e a uma reforma ministerial que visava recompor as bases de sustentação do governo tendo em vista os futuros embates político-eleitorais.

 

4 – Novas dificuldades: Café e salários

 

           

            No início de 1954, as perspectivas de evolução do setor externo da economia brasileira pareciam favoráveis, e as preocupações centrais do governo deslocaram-se para o problema da inflação, identificando no déficit público as pressões para expansão do crédito e o aumento da oferta de moeda.

 

            Projeções favoráveis em relação a situação cambial: a) expectativas favoráveis com relação as receitas do café; b) confiança na possibilidade de renegociar as condições de pagamento do empréstimo do Eximbank.

 

            As grande dificuldades surgidas para o programa de estabilização econômica foram o aumento de 100% do salário mínimo e os problemas com o café. A proposta do ministro João Goulart era de um reajuste 100%, enquanto que o percentual para recomposição do pico do reajuste anterior era de cerca de 53%. A UDN e a FIESP defendiam um reajuste próximo a 33%.

 

            As exportações brasileiras diminuíram abruptamente tendo como uma das causas a forte geada ocorrida no Brasil (sobretudo no Paraná).

 

5 – A última crise

            Quando Vargas assumiu, em 1951, o fez sob um clima de expectativas generalizadas. Seu projeto de governo original contemplava essas expectativas. Na impossibilidade de realiza-lo a margem de manobra do governo reduziu-se consideravelmente. O exemplo para ilustrar essa afirmativa é a lembrança de que não houve vacilação na opção entre estabilização da economia em meados de 1953, mas quando colocado diante da proximidade das eleições, Vargas optou por uma política salarial em desacordo com os propósitos das autoridades econômicas.

            Os trabalhadores que constituíram importante base eleitoral para a vitória de Vargas em 1950, desde princípios de 1953 demonstravam crescentemente sua frustração e descontentamento. O aumento do salário mínimo em maio de 1954 angariou alguma simpatia. Contudo, a medida visava as eleições de outubro e não era suficiente e nem era o objetivo de Vargas para fazer do pouco organizado movimento dos trabalhadores a coluna que sustentaria o governo.

            Sem poder contar com apoio popular e envolvido crescentemente pela insatisfação de diversos setores empresariais, o isolamento político de Vargas era um fato. Nesse contexto, aconteceu o atentado da rua Toneleros.

            O suicídio de Vargas teve profundas repercussões históricas, possibilitando a formação de uma ampla frente anti-golpista que assegurou a manutenção da ordem constitucional e converteu o que seria uma antecipação de 1964 numa administração provisória de gestores de negócios e posteriormente a eleição de Juscelino Kubitschek.

 

Referências bibliográficas:

D’ARAUJO, Maria Celina S. O segundo Vargas 1951-1954, São Paulo. Editora Atlas, cap. 6, 1992.

MELO, Hildete P. OLIVEIRA, Adílson. ARAÙJO, João L. O sonho nacional: petróleo e eletricidade (1954-1994), in Vargas e a Crise dos Anos 50. Relume Dumará, Rio de Janeiro. 1994.

VIANNA, Sérgio B. Duas tentativas de estabilização, in ABREU, M. (org), “A Ordem do Progresso - Cem Anos de Política Econômica Republicana 1889-1989”. Editora Campus, Rio de Janeiro, 1990.